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É preciso tempo para curar as feridas, para que parem de sangrar, para que se tornem apenas cicatrizes. É preciso tempo para se falar nas feridas do outrora, cicatrizes do agora, marcas subtis de um passado que dilacerou a alma e o coração, que enlaçou esperanças, que ofuscou a visão ingénua de alguém que nada sabe do mundo. Nem do amor, nem de coisa alguma.
Locomotiva do coração, foste-o. Ouvi, do teu silêncio, as palavras que me tocaram o coração e senti, dos gestos que não existiram, o doce toque que me embalou. Dirigi-me ao teu coração e tu tapaste-lhe os ouvidos, depois de lhe teres vendado os olhos. E, mesmo assim, locomotiva do coração… foste-o.
Experimentei a força mais subtil do mundo de Gandhi e deixei-me envolver por ela, construindo sonhos sobre areias movediças. E depois veio o vento e a chuva, a força do mar brotou e levou tudo. Não deixou nada para lá das memórias e das histórias que veem à ideia de cada vez que a cicatriz se mostra como que a dizer cuidado.
Aquilo que, finalmente, se tornou cicatriz, outrora, sangrou muito, fez-me retorcer com dores. Hoje, é somente cicatriz. Somente uma marca fiel à tua passagem pela minha vida, que não pode ser apagada nem ignorada. Porque não foram só as dores (dores do crescimento, quiçá), não foram só as lágrimas que rolaram desenfreadas pelo meu rosto ou as que reprimi em silêncio, não foram só as ilusões que se metamorfosearam, dando lugar às mais dolorosas desilusões; foram, também, as estrelas e os raios de sol que vi, quando as nuvens cobriam os céus, foram os sorrisos e os sonhos que deram a energia necessária aos dias inertes, foi a felicidade por ouvir o teu nome, por te ver depois de meses sem o poder fazer, por poder tocar-te, mesmo sabendo que nunca te chegaria ao coração.
Não é certo dizer que foi inglório, porque não o foi de facto. Eu cresci, descobri a força em mim que não sabia que tinha, redescobri-me a cada novo acordar, reinventei-me e adaptei-me. Tudo aquilo por que passei ajudou a definir-me como pessoa, como mulher.
E também não será correto dizer que não aconteceu, infelizmente. Não aconteceu, porque, porventura, tu e eu não tínhamos assim tanto a aprender um com o outro, enquanto um nós.
Hoje, se (te) escrevo isto é porque o tempo me ajudou como espero que te ajude a ti, sempre que precisares. Hoje, sou uma flor diferente. Desabrochei e uma borboleta pousou numa das minhas pétalas para estabelecermos uma relação plena de simbiose. E é tão bom.
Foste amor sem o saber ser, no teu silêncio e nos gestos que não soubeste ter. Ainda assim, não tens culpa.
Ao amor que nunca o soube ser,
Um até depois.